« No Estranho Caso do Dr.Jekyll e Mr. Hyde de Stevenson, livro já referido, a iluminação a gás das ruas tem um papel importante, embora discreto. Acontece o mesmo com muitos livros do século XIX. Por exemplo, em Os Maias, de Eça de Queirós, a referência ao «gás» aparece mais de trinta vezes. Mas de que gás se trata, afinal? No final do século XIX, quase todas as cidades tinham uma fábrica de gás, mas são relativamente poucas as marcas culturais que destas fábricas permaneceram até aos dias de hoje.
Em Lisboa ainda hoje podem ser encontrados vestígios destas instalações, designadamente a fachada da fábrica da Boavista e os esqueletos dos gasómetros (tanques de gás) na Marinha. No Porto, a fábrica de gás, assim como o gasómetro, situavam-se na actual zona da rua do Ouro. Em Coimbra, no final da rua da Sofia e início da rua da Figueira da Foz (designada assim apenas a partir de 1903), acompanhando a actual rua João Machado, situou-se de Outurbo de 1856 até aos anos 20 do século XX a Fábrica de Gás. Nesta fábrica era produzido o gás para iluminação pública e privada da cidade, o qual saía em tubos de ferro para os candeeiros de cobre da cidade. O gasómetro situava-se na rua João Machado, que era nessa altura denominada rua do Gasómetro.
O gás era produzido pelo aquecimento a cerca de 1000 ºC do carvão numa retorta fechada, o que dava origem a um gás combustível, mistura de metano e monóxido de carbono, que por fezes seria designado como gás carbónico, nome que hoje usamos para o dióxido de carbono. Os candeeiros tinham de ser acesos, a chama do gás era amarelada e o gás fazia barulho característico a sair do bico e arder, talvez semelhante ao dos fogões a gas ou candeeiros Petromax que algumas pessoas ainda usam no campismo. »
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Fonte: S. Rodrigues, Jardins de Cristais: Química e Literatura, Gradiva