(...) O isolamento de produtos naturais em forma pura, no final do século XIX, foi um passo decisivo
para a criação da indústria farmacêutica. Durante a primeira fase os produtos naturais se constituíram na principal fonte de insumos para a preparação de medicamentos. A quinina (Figura 1) foi isolada da casca de quina (Cinchona sp) por P. J. Polletier e J. Caventou, em 1820. Em 1826 estes professores da École Superieure de Pharmacie de Paris desenvolveram um método para obtenção em grande escala e passaram a comercializar a quinina em forma pura. Em 1848 Merck isola a papaverina de Papaver somniferum e instala na Alemanha a primeira farmácia‐fábrica. Ambos contribuíram de forma muito importante para o surgimento da indústria farmacêutica
Quinina, o primeira molécula pura a ser isolada de uma fonte vegetal.
(...) Dos 847 fármacos de baixo peso molecular (micromoléculas) lançados no mercado entre 1981 e 2006, 43 eram produtos naturais, 232 produzidos por hemi‐síntese a partir de produtos naturais e 572 obtidos por síntese total. Entretanto, 262 entre estas últimas substâncias possuíam um grupo farmacofórico inspirado em produtos naturais ou poderiam ser considerados análogos de produtos naturais.
_____Fonte: P.R.R. Costa, Produtos Naturais como Ponto de Partida para a Descoberta de Novas Substâncias Bioativas: Candidatos a Fármacos com Ação Antiofídica, Anticâncer e Antiparasitária, Revista Virtual de Química, 2009, 1 (1), 58‐66.
A hemi-síntese de fármacos, e a arglabina como exemplo:
A síntese da arglabina demonstra o conceito básico de hemi-síntese (ou semi-síntese), na qual um composto da Natureza mais prontamente disponível, com uma estrutura relativamente semelhante, pode ser transformado num composto de maior valor.
A arglabina (...) possui um sistema de anel 5,7,5-tricíclico com cinco centros estéreo contíguos nos quais os dois anéis de cinco membros são trans-anulados. A molécula mostra atividade antitumoral promissora contra diferentes linhas celulares tumorais.
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Fonte: D. P. de Sousa, Bioactive Essential Oils and Cancer, Springer, 2015.+ S.H.Lone, K.A.Bhat, M.A. Khuroo, Arglabin: From isolation to antitumor evaluation, Chemico-Biological Interactions, 240(5), 2015, 180-198.
Hemi-síntese de arglabina a partir de partenolida.
A histórica relação das plantas e seu compostos com os fármacos e a indústria farmacêutica:
Houve um tempo, há não muito tempo atrás, em que dependíamos exclusivamente de plantas, micróbios e animais para novos medicamentos, e foi aí que encontramos 40% de todos os nossos medicamentos de prescrição. Aqui está uma pequena amostra do que as plantas sozinhas nos deram no campo dos produtos farmacêuticos:
- O taxol, isolado da casca do teixo do Pacífico (Taxus brevifolia) no noroeste do Pacífico, é um novo medicamento promissor usado para tratar pacientes com cancro de ovário e mama;
- A hormona esteróide diosgenina, isolado dos inhames selvagens (Dioscorea composita) no Mexico foi um ingrediente essencial nas primeiras pílulas contracetivas. Mais aqui e aqui
- Vincristina e vinblastina, isoladas da vinca-de-madagáscar (Catharanthus roseus), usadas no tratamento da doença de Hodkin e de certos tipos de leucemia infantil.
- Um derivado semi-sintético da Mandrágora Americana' (Podophyllum peltatum), uma planta comum da floresta do leste dos Estados Unidos, é usado para tratar o cancro testicular e o cancro de pulmão de pequenas células.
- A digitalis, das folhas secas da dedaleira roxa (Digitalis purpurea), é usada para tratar a insuficiência cardíaca congestiva e outros distúrbios cardíacos.
- A reserpina, isolada das raízes de arbustos tropicais do género Rauwolfa, é usada como sedativo e no tratamento da pressão sanguínea alta.
No final da década de 1970, no entanto, as plantas caíram em desuso como candidatas à pesquisa farmacológica. Bactérias e fungos do solo continuavam produzindo novos antibióticos, e a química sintética e a biologia molecular - sob a rubrica de "design racional de medicamentos" - eram vistas como a próxima grande fonte de medicamentos.
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Fonte: Janine Benyus, Biomimicry: innovations inspired by Nature, Harpercollins, 2009.