Nesta publicação fazemos um ponto de situação (à data de Janeiro de 2024) aos progressos observáveis no tema da microfluídica.
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A microfluídica pode ser definida como a ciência da manipulação de fluidos em sistemas de tamanho micrométrico. Os fluidos podem ser gases, líquidos, newtonianos ou não, mono ou multifásicos (por exemplo, óleo e água). Os sistemas podem ser dispositivos com canais, superfícies padronizadas ou folhas de papel. Micrométrico é uma ordem de grandeza. Na prática, as escalas microfluídicas variam de 100 nm a 1 mm.
Fonte: Patrick Tabeling. Introduction to Microfluidics. Reino Unido: OUP Oxford, 2023.
A primeira vez que falámos de microfluidos no BEQ em 2010 foi chamando a atenção para a existência de reatores de escala milimétrica e micrométrica. Seguiu-se uma segunda publicação sobre o mesmo tema, evidenciando como é possível produzir em escala a partir de uma escala tão pequena.
No ano seguinte demos conta de que a microfluídica abria caminho à criação de miniaturas de laboratórios de análises, designados lab-on-a-chip (chip-laboratório), onde se contemplava a hipótese de os usar no setor aeroespacial para análises a moléculas biologicamente relevantes em ambientes extraterrestes.
Daí saltamos para 2014, onde demos conta de um prémio de inovação para o professor Manu Prakash da Universidade de Stanford, por ter adaptado o mecanismo subjacente a uma convencional caixa de música no sentido de a transformar numa caixa de controlo de fluidos à escala micrométrica.
Em 2018 trouxemos o tema de bombagem catalítica, que introduz a possibilidade de movimento também sólidos à escala micrométrica por intermédio do escoamentos de fluidos e da indução de atividade catalítica que crie oscilações de densidade desencadeadoras de escoamento dessas partículas.
No mesmo ano voltámos ao tema de lab-on-chip, que abre portas para a miniaturização de laboratórios de química e a aceleração de ensaios experimentais (como síntese química) por via das facilidades operacionais criadas.
Em 2021 falámos das potencialidades do lab-on-a-chip para monitorizar a qualidade de água em piscinas.
Ainda nesse ano comunicámos o impressionante conceito de ‘Organs-on-Chips’ (orgãos humanos em chips), e com ele a possibilidade de desenvolvimento mais eficiente e barato de novos fármacos, assim como uma alternativa aos testes em animais.
Popularidade a nível mundial
De acordo com o portal Trends da Google, o termo microfluidics encontra-se com tendência de queda desde 2004 (data mais recuada em que há dados disponíveis), tendo estado em 2023 no limiar de 25 pontos relativos de interesse.
Do ponto de vista geográfico, há uma polarização de interesse na Ásia, pois os países com interesse mais destacado são: Singapura (100, máximo da escala de interesse); Coreia do Sul (81 na escala); Suiça (53); Hong Kong (49); e China (39). A título de curiosidade, os EUA pontuam 27; Portugal pontua 24; e o Brasil pontua 2.
Popularidade global do tema microfluídica segundo o Google Trends
De modo surpreendente, se o filtro for feito por cidades, descobrimos que as oito localizações individuais com maior interesse pelo tema da microfluídica são dominadas pela nação norte-americana:
- Cambridge (Massachusetts,EUA), com 100 pontos;
- Ithaca (Nova Iorque, EUA), com 72;
- Enschede (Países Baixos), com 71;
- Berkeley (Califórnia, EUA), com 63;
- Blacksburg (Virginia, EUA), com 51;
- Cambridge (Reino Unido), com 45;
- Daejeon (Coreia do Sul), com 44;
- Basileia (Suíça), com 26;
Popularidade em investigação
A investigação em microfluídica tem estado a acelerar, tendo terminado o ano de 2023 com cerca de 9000 novas publicações. Embora se observe um crescimento contínuo desde o ano 2000 a aceleração das publicações acontece a partir da década de 2010 e é ampliada a partir da década de 2020. Se organizarmos todas estas publicações em termos de grandes áreas científicas observa-se que engenharia química surge em quinto lugar com 10789 publicações. Embora elevado este valor é metade das publicações atribuíveis à área da química, com que é de todas a que mais tem publicado em microfluídica. Seguem-se as áreas de 'química, genética e biologia molecular'; engenharia (genérica); e ciência de materiais.
De acordo com o portal Google Scholar os 3 artigos científicos mais relevantes no tema de microfluídica são artigos de revisão, sendo dois deles na área bio (biomédica e biologia) e um na área de física.
Começando pela física, o artigo de revisão publicado em 2005 por Todd M. Squires e Stephen R. Quake da California Institute of Technology, estabelece um paralelo entre a revolução que os circuitos integrados micro fabricados trouxeram à computação com aquilo que a microfluídica pode trazer aos ramos da química e da biologia, abrindo caminho a que numerosos ensaios experimentais possam ser feitos rapidamente e em paralelo.
No que toca à área biomédica foi publicado em 2014 na prestigiada revista Nature um artigo de revisão assinado pelos autores Eric K. Sackmann, Anna L. Fulton & David J. Beebe, da University of Wisconsin-Madison. Nele se dá conta das potencialidades da microfluídica na melhoria da investigação em biologia e nos métodos de diagnóstico. É realçada a precisão face a técnicas convencionais e é abordado o conceito de laboratório-chip (lab-on-a-chip).
Popularidade em patentes
Os dados mundiais de patentes obtidos, disponibilizados pelo Google Patentes, e organizados por triénios, mostram que desde 1995-1998 as patentes no tema de microfluídica tem vindo a aumentar, sobretudo a partir de 2001. O máximo de patentes foi atingido no triénio 2016-2019, observando-se uma redução no triénio seguinte.
Apesar de se observar uma considerável dispersão de proprietários, os maiores proprietários individuais abrangem 15% das patentes.
Neste grupo estão 4 universidades norte-americanas, a saber:
- University Of California | 4.1%
- Massachusetts Institute Of Technology | 3%
- Harvard College | 2.9%
- California Institute Of Technology | 2 %
Sozinha no meio desse conjunto está empresa Advanced Liquid Logic, Inc., com 3.1% A Advanced Liquid Logic (ALL), é desde 2013 uma subsidiária integral da Illumina, Inc., sendo fornecedora de soluções de manuseio de líquidos. A ALL desenvolveu uma tecnologia proprietária de “microfluídica digital” baseada em eletroumedecimento (electrowetting) que manipula com precisão pequenas gotas dentro de um cartucho descartável selado para realizar protocolos laboratoriais complexos.
A tecnologia versátil da ALL foi demonstrada em inúmeras aplicações, incluindo isolamento de ácidos nucleicos de vários tipos de amostras. A sua solução robusta tem uma clara vantagem no manuseio preciso de pequenos volumes de amostras, um foco cada vez mais importante para os clientes.
A ALL foi desmembrada da Duke University em 2004 como resultado da visão dos cofundadores Michael Pollack e Vamsee Pamula para microfluídica, que foi inspirada na transição da indústria de tecnologia para o digital. A empresa detém mais de 200 patentes emitidas e pendentes, e sua microfluídica digital permite soluções elegantes para problemas fluídicos complexos.
Imagem: Patente WO US US7863035B2
Perspetivas de mercado
Fonte: Markets & Markets