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Sobre o armazenar e transportar como bottleneck da competitividade na produção de hidrogénio verde, e progressos no armazenamento sob estado supercrítico

A produção de hidrogénio através da eletrólise utilizando eletricidade renovável é considerada um caminho e componente importante para um sistema energético sustentável do futuro. Para esta via de produção é crucial um elevado potencial de energia renovável, especialmente energia solar. Países como a Alemanha, com elevada procura energética e baixo potencial solar, dependem fortemente da importação de hidrogénio. 

Num trabalho assinado pelos investigadores alemães e portugueses F. Eckl, L. Eltrop, A. Moita, R.C. Neto, é realizado um estudo com duas opções alternativas de fornecimento de hidrogénio para avaliar a viabilidade económica do hidrogénio solar fornecido a um gasoduto de hidrogénio em Estugarda, Alemanha. Para ambas as opções, o hidrogénio é gerado através de um eletrolisador alcalino de 8 MW, alimentado por energia solar e apoiado por eletricidade da rede para satisfazer a carga necessária. A primeira opção baseia-se num sistema de produção de hidrogénio que está localizado em Sines, Portugal, uma zona com elevada radiação global e próxima de um porto marítimo profundo. O hidrogénio é processado por liquefação e transportado para Estugarda por navio-tanque via Hamburgo e por camião. A segunda opção de fornecimento utiliza um sistema de produção de hidrogénio no local, em Estugarda.

O trabalho mostra que os custos de produção em Sines com 2,09 €/kgH2 (preços em 2021 €) são, como esperado, significativamente inferiores aos de Estugarda com 3,24 €/kgH2. No entanto, esta diferença de preço de 1,15 €/kgH2 para a produção de hidrogénio cai para uma diferença marginal de 0,13 €/kgH2 quando se considera toda a cadeia de valor até ao ponto de entrega em Estugarda. Se o calor residual da eletrólise for utilizado num sistema de aquecimento urbano em Estugarda, a diferença de preço cai para 0,03 €/kgH2. A primeira opção de fornecimento é dominada pelos custos de processamento, especialmente de liquefação. Estes custos teriam de ser reduzidos para explorar plenamente a vantagem de custos da produção de hidrogénio solar em Portugal. Além disso, deve ser considerada uma mudança fundamental para o transporte de hidrogénio gasoso por gasodutos. Ambas as opções de fornecimento de hidrogénio investigadas mostram o potencial para fornecer hidrogénio ao gasoduto de Estugarda a custos mais baixos do que utilizando a tecnologia alternativa de reforma a vapor do gás natural.

Fonte: F. Eckl, L. Eltrop, A. Moita, R.C. Neto, Techno-economic evaluation of two hydrogen supply options to southern Germany: On-site production and import from Portugal, International Journal of Hydrogen Energy, 47, 60 (2022) 25214-25228.


A energia, custo e escala associados à liquefação do hidrogénio:

A liquefação do hidrogénio consome muita energia. As centrais de liquefação de hidrogénio existentes necessitam de cerca de 13 kWh de eletricidade por kg de hidrogénio. Isso representa cerca de 30% da energia armazenada no gás hidrogénio [8]. O consumo mínimo teórico de energia para a liquefação do hidrogénio (de 298 K a 20 K a 1 bar) é de 3,7 kWh de eletricidade por kg de hidrogénio, equivalente a 9,3% da energia armazenada no hidrogénio [8]. Novos processos em desenvolvimento podem reduzir o consumo de energia para 6 kWh de eletricidade por kg de hidrogénio com refrigeração magnética, atingindo eficiências de 50% do ciclo de Carnot [9].

(...) Outro aspecto que aumenta significativamente a eficiência da liquefação são os ganhos de escala. Por exemplo, o aumento na liquefação de hidrogénio de 100 para 1000 toneladas por dia reduz os custos de liquefação de 2 para 1 USD/kg de H2 [8].


Progressos na liquefação por compressão:


A Calvera Hydrogen, uma empresa líder e pioneira na indústria europeia do hidrogénio, com mais de 40 anos de experiência na concepção e fabrico de equipamentos de compressão, transporte, armazenamento e distribuição de hidrogénio de alta pressão sob os mais elevados padrões de segurança, desenvolveu na sua instala em Saragoça (Espanha) o modelo de reboque tubular de hidrogénio com maior capacidade do mundo. O equipamento foi projetado para transportar 1,0 tonelada (2.270 lbs.) de hidrogénio nas estradas dos EUA e mais de 1,3 toneladas (2.870 lbs) nas estradas da UE (devido às diferentes regulamentações de peso rodoviário de cada região), com uma pressão de trabalho de 517 bar (7.500 psi). Isso o torna o reboque tubular com maior pressão de trabalho do mercado internacional. É feito de fibra de carbono de última geração e tem 45 pés de comprimento. Este projeto foi desenvolvido para a Shell Hydrogen e será usado para atender as estações de reabastecimento de hidrogénio da Shell em todo o mundo.

(...) O equipamento foi concebido para optimizar ao máximo a capacidade e pressão do hidrogénio armazenado, e assim conseguir a máxima eficiência e poupança de custos no despacho de hidrogénio nos postos de abastecimento de hidrogénio actuando através de válvulas automáticas integradas no tubo reboque em diferentes estágios de pressão e desempenhando a dupla função de armazenamento inteligente móvel e fixo.

Fonte: Calvera


Um facto pouco falado: armazenamento de H2 sob estado supercrítico 



Embora não o mencione explicitamente, se um sistema como o da Calvera Hydrogen se propõe transportar H2 sob pressões bem acima de 13 bar, e a temperaturas atmosféricas (ou quasi-atmosféricas), então o que na realidade sucede é que estaremos a falar de armazenamento de H2 em estado supercrítico. O ponto crítico do H2 situa-se nos 13 bar e -239.95 °C e portanto qualquer combinação P-T que exceda ambos os valores significa que o fluido resultante é um fluido supercrítico e não um líquido ou gás pressurizado.

Por definição um fluido supercrítico exibe propriedades fisicoquímicas intermédias entre as de um líquido e as de um gás, e embora possa até atingir uma densidade igual à do estado líquido, tecnicamente o que acontece não é uma liquefação. Trata-se de um fluido que nem é um gás nem é um líquido, está sob estado supercrítico. 

Os fluidos supercríticos mais populares são o CO2 (ex.: como solvente/tecnologia de extração; agente de impregnação; ou fluido de trabalho de turbomáquinas para geração de energia elétrica) a água (ex.: hidrólise supercrítica), e eventualmente o etano e propano, embora estes sejam explosivos e de mais delicada utilização.

A economia em torno do H2 verde parece estar a apostar fichas na possibilidade de armazenar H2 sob estado supercrítico e com isso poderemos estar no limiar de que o hidrogénio supercrítico passe a representar o mais proeminente representante da família dos fluidos supercríticos, ainda que tenha como papel prático o de "apenas" viabilizar o seu armazenamento e transporte. Estas são das maiores dúvidas subjacentes a eleger o hidrogénio como o combustível verde universal.